Tarifaço atinge 77,8% das exportações brasileiras

Um levantamento recente feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) apontou que 77,8% das exportações do Brasil aos Estados Unidos estão sujeitas a tarifas adicionais. Segundo o estudo, a alíquota máxima incide sobre 7.961 produtos diferentes, recaindo sobre 41.4% das remessas brasileiras.
O setor mais atingido foi a indústria de transformação, que responde por 69.9% das exportações com tarifa de 50%. Em 2024, obteve um total de US$ 12,3 bilhões nas exportações em 2024 Outros setores fortemente impactados pelas sobretaxas incluem:
- Vestuário e acessórios – 14,6%;
- Máquinas e equipamentos – 11,2%;
- Produtos têxteis – 10,4%;
- Alimentos – 9%;
- Químicos – 8,7%;
- Couro e calçados – 5,7%
A indústria extrativa tem a maior concentração de produtos não taxados, representando 68.9% das exportações livres de tarifas.
Os produtos não afetados pelas tarifas, por sua vez, representam 22,2% da pauta e somaram US$ 9,4 bi em 2024, com destaque para o petróleo leve e pesado, combustíveis automotivos e óleos industriais não-biodiesel.
Plano de contingência
Segundo informações divulgadas na imprensa, o presidente se reúne com ministros nesta terça-feira (12) para discutir o chamado Plano de Contingência que deve fazer frente ao tarifaço. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a proposta deve incluir três eixos: as linhas de financiamento, levando em conta o crédito via BNDES, o fundo para exportações e medidas de cunho tributário, com compras governamentais para produtos perecíveis estocados.
BFC Comenta
Como esses dados mudam o perfil de risco e necessidade de crédito para os setores impactados?
Apesar das exceções concedidas para alguns setores pelo governo americano, o impacto das tarifas continua bastante abrangente. Empresas que exportam para os Estados Unidos podem ter seus contratos repentinamente cancelados, ficando com produtos prontos sem destino certo. Caso não consigam encontrar compradores alternativos rapidamente e tenham uma curva ABC muito concentrada, essas empresas sofrem prejuízos milionários e sua sobrevivência fica comprometida. Um crédito emergencial ou aporte de capital pode ser indispensável para o cumprimento das obrigações de curto prazo.
Como esse aumento de tarifas impacta a formação de preços das empresas exportadoras?
Na prática, uma tarifa de 50% torna os produtos brasileiros drasticamente mais caros, eliminando completamente a sua competitividade no mercado americano. As empresas terão que vender para outros países e no mercado interno, seguindo preços de mercado, porque o mercado americano fica totalmente distorcido e inacessível para a maioria dos produtos. Em vários dos setores afetados, o Brasil possui uma vantagem de custo expressiva, sendo o produtor mais barato globalmente, mas a vantagem é eliminada completamente pelas tarifas. No caso do açúcar, por exemplo, nós somos o maior produtor global. As usinas do Centro-Sul brasileiro têm um custo de produção de cerca de 15,91 centavos de dólar por libra, versus 22,42 na Índia, o segundo maior produtor. Dito isso, no cenário atual, isso pouco importa para o mercado americano.
Quais ajustes imediatos os empresários devem considerar na gestão financeira para lidar com esse novo cenário?
Como dizem os americanos, “cash is king”. É fundamental que as empresas afetadas priorizem seu caixa neste momento de turbulência para manter sua liquidez no curto prazo.
De um ponto de vista operacional, primeiramente os empresários devem buscar melhores condições negociais com seus fornecedores, buscando alongamentos de prazos e adiando compras para evitar carregar muito estoque de vendas canceladas. Além disso, é crucial iniciar conversas comerciais com compradores em outros países e no mercado interno para buscar mercados alternativos. Finalmente, deve-se buscar economias em toda a DRE da companhia, cortando qualquer custo supérfluo para sustentar ao máximo a margem do negócio.
Pela ótica financeira, um capital de giro emergencial pode ser crucial para dar o fôlego necessário para as empresas honrarem seus compromissos no curto prazo.
Em que medida a antecipação de recebíveis pode aliviar essa pressão no curto prazo?
A antecipação de recebíveis também pode ser uma excelente alternativa de curto prazo para as empresas, enquanto negociam linhas de capital de giro com prazo mais longo. Além de não ter incidência de IOF quando realizada com Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), a antecipação não aumenta a alavancagem do balanço, pois simplesmente antecipa receitas futuras.
Que cuidados as empresas precisam tomar ao revisar orçamentos e metas para os próximos trimestres?
Por ter caráter primariamente político, as tarifas americanas acabam tendo um grau de complexidade maior que aquelas impostas na maioria dos outros países. Certamente, acabarão em algum momento, mas, como o Trump ainda está no início de seu mandato, é importante ser conservador nos orçamentos dos próximos trimestres, preparando o barco caso haja uma tempestade mais duradoura. Quanto mais exposição o empresário tiver ao mercado americano, mais precauções deve tomar. Além de controlar ao máximo as despesas para manter a margem, que tende a cair com a desalavancagem operacional das vendas canceladas, é importante avaliar projetos de investimento com mais cautela, priorizando sempre um balanço de forte liquidez. A única exceção talvez seja as despesas comerciais, que se tornam prioritárias na medida em que o empresário precisa encontrar rapidamente novos mercados para os seus produtos.